terça-feira, 31 de março de 2015

A decadência dos regionais. Tem explicação? Tem. Mais de uma.

Ano após ano a discussão do futebol brasileiro nessa época é a mesma. O que aconteceu com os estaduais?

As soluções para um problema que não foi corretamente identificado são sempre as mesmas: diminuir ou suprimir. Substituir por Regionais ou por amistosos.

As médias de público são cada vez menores. Jogos de times pequenos atraem cada vez menos atenção. Os estaduais padecem de um mal que parece ser irreversível. 

Explicação, não há somente uma. São várias, e todas se relacionam. E mais, elas podem e até tendem a se acentuar, podendo fazer com que, no futuro, os estaduais realmente desapareçam.

Não pretendo esgotar a matéria. Apenas apontei alguns elementos que considero os mais importantes:

- Êxodo de bons jogadores: 
Fenômeno que se acentuou desde a década de 80, ligado também aos outros fatores que vou elencar, bem como à estagnação financeira brasileira, a abertura comercial e o crescimento econômico europeu. As Copas de 1990 e 1994 foram a virada: pela primeira vez, mais jogadores "estrangeiros" eram convocados que os nacionais. Quem não se lembra daquele rapaz que não tinha estourado por nenhum time brasileiro e foi a nossa maior esperança em 1998? Ronaldo.

Quem perdeu mais foram os times pequenos, que não tem condições de competir com os times grandes e os mercados internacionais. Antes eles chegavam a formar bons esquadrões, como o Guarani de 1978, campeão brasileiro, o Bangu de 1985. E a Ferroviária de Araraquara que já bateu o Santos de Pelé e chegou a excursionar pela Europa? Hoje ninguém mais se lembra.

Ferroviária de Araraquara bate o Santos de Pelé em 1969. Foto: Tardes de Pacaembu


Hoje os nossos melhores jogadores vão embora antes mesmo de despontar aqui. Sobram apenas juniores, jogadores médios e craques em fim de carreira. Essa é a situação comum dos times grandes, com raras exceções, e mais ainda dos times pequenos.

E quem quer assistir um jogo de São Bento x Penapolense? Isso levou a outro fenômeno....

- Ausência de identificação da torcida com os times:
Falta de bons jogadores. Queda de técnica, de número de gols. Falta motivos para ir aos estádios. Diminuiu bastante a identificação da torcida com os times. E isso passou como um trator pelos times pequenos. Antes, ver Madureira jogar contra o Flu de Rivellino era um programaço de domingo. Ou o Tupi contra o Cruzeiro de Tostão. E se engana quem pensa que os jogadores dos times menores eram ruins de bola.

Os estaduais diminuíram de tamanho. Antes eram os campeonatos mais importantes do Brasil, jogados o ano todo. Depois, 6 meses, e hoje, praticamente três meses. Os times pequenos por vezes só jogam um trimestre no ano. Isso leva a um déficit financeiro, claro, eis que caem as receitas com TV e público, e outras coligadas como produtos e franquias.

Perder os melhores jogadores se tornou praxe. Basta esperar a próxima janela de transferência para ver parte ou todo seu time desfigurado. E hoje o torcedor nem se acostuma com um jogador, para logo em seguida já velo jogando no Bunyodkor.

Firmino nem bem começou a jogar no Brasil e já foi vendido para a Alemanha.
Hoje é um dos selecionados da amarelinha. Foto: Arquivo Internet


E mais uma vez os times pequenos saíram perdendo mais ainda. Mais vale hoje montar um time para se destacar e vender todo mundo do que manter o plantel. Claro, jogando pouco no ano, os estaduais viraram uma espécie de feira. Assim como a Copa São Paulo. Os times de empresários pipocam pelos país.

A queda de identificação leva a queda de público. E como efeito colateral temos...

- Crescimento da violência nos estádios

Foto: Arquivo Internet

O futebol deixou de ser encarado como um programa prazeroso. Mas os torcedores mais fanáticos não deixaram de ir. Mas justamente parte desta torcida é justamente aquela que acredita defender o seu time por meio da violência. As vezes contra outras torcidas do próprio time. A violência cresceu, afastando o torcedor comum dos estádios. E já não era bom ver a Matonense jogando pra vender jogador, imagina quando tem briga?

- Globalização futebolística:
Falei da estagnação econômica e da abertura comercial, que estão ligadas ao fenômeno da globalização, que implicou especialmente no incremento da mídia e formas de transportes.

Isso quer dizer: É muito mais fácil saber o que se passa na Europa. E onde estão os nossos melhores jogadores e do mundo todo? Lá. É natural que o nosso interesse pelos campeonatos do velho continente cresça. E lá tem estaduais? Não. E qual jogo os torcedores vão preferir assistir, Avenida x Ypiranga ou Barcelona x Milan?

A globalização também implicou com o crescimento da Libertadores, que até a década de 80, ou especificamente 1992, era um torneio deficitário, violento e relegado. Na década de 50 a 80, os torneios estaduais e regionais tinham muito mais apelo.

- Paralelismo europeu
Assistir o que acontece na Europa, que tem melhores jogadores, e logicamente, um futebol mais técnico, gera uma noção de que lá há uma panaceia e solução de todos os problemas do nosso futebol. Basta copiar. E como eu disse, lá não tem estaduais e os campeonatos nacionais são enxutos.

- Somando, então os nossos melhores jogadores estão na Europa, os nossos jogos tomamos como desinteressantes, os times viraram vitrines, o público é pequeno. Tudo isso acentua sobremaneira a decadência que identificamos nos campeonatos estaduais. E é incrível ver que o Brasil, lembremos, tem dimensões continentais, já teve estes certames como os melhores e mais técnicos.

A conclusão a que se chega é que tais fatores são estruturais. E isso quer dizer que qualquer mudança depende de uma boa dose de vontade, outra boa dose de tempo e um quinhão significativo de planejamento.

Pensar nos regionais talvez seja uma forma de remediar em parte a nossa falta de interesse, claro, os times maiores jogam mais entre si, mas e os pequenos? E os times com quase nenhuma estrela? E a violência nos estádios? E os desequilíbrios financeiros dos clubes? Enquanto isso não mudar, não adianta, podemos criar um brasileiro só com clássicos, e ainda assim, o interesse vai ser bem menor do que o que já tivemos.

O que o futuro dirá?